Maria tem 25 anos, casada,
grávida e frequenta o serviço público de saúde para consultas médicas e
realizar seus exames do pré-natal. Mas o descaso é frequente seja na marcação
das consultas ou no atendimento dos profissionais de saúde. Durante as consultas,
o profissional de saúde não oferece muita atenção e assim, Maria não tem suas
dúvidas sanadas sobre a gestação.
Com o tempo, ela fica “habituada”
com a falta de atenção e pouca empatia do profissional de saúde. E assim com o
passar do tempo, a gestação vai evoluindo e eis que Maria sente as dores do
parto. Ela procura a maternidade mais próxima e lá após uma relativa espera,
ela é atendida.
Durante o atendimento, são
realizados os procedimentos de rotina, nenhuma pergunta é feita pelo profissional
de saúde a gestante e logo depois, este fala que ela pode retornar para casa
pois, a dilatação ainda não é suficiente.
Mesmo com muitas dores, ela volta para
casa e lá a intensidade das dores aumenta e assim, procura novamente a
maternidade. Lá ela fica em observação e é submetida a vários toques que eram
realizados por diferentes profissionais de saúde.
Maria se sente constrangida, mas,
assim como durante a gestação, ela não fala. Durante este período, o
companheiro de Maria chega a maternidade. Após um certo tempo, ela é levada
para a sala de parto, mas seu marido é impedido de acompanhá-la.
Devido a
intensidade das dores, Maria chora e neste momento, um dos profissionais fala:
” Na hora de fazer, você não chorou”.
Por mais que tente, ele não consegue
reprimir as lágrimas. Durante o procedimento, ele se sente sozinha, irritada e
humilhada pela falta de atenção e empatia da equipe que conversa sobre
banalidades da vida e não oferece nenhum “conforto” emocional durante este
momento.
Caro (a) leitor (a), esta
história contada até aqui é fictícia, mas ela reúne diferentes abusos e
violências direcionados às mulheres durante a gestação e o parto. Porém, antes
de mais nada, não quero deixar aqui a impressão que todos os profissionais de
saúde dos serviços públicos praticam este tipo de atendimento.
Minha intenção
neste texto não é generalizar. Mas chamar a atenção para a violência e abusos
exercidos por alguns profissionais e instituições de saúde.
Para tornar esta realidade mais
clara, trago aqui constatações feitas pela pesquisa Mulheres brasileiras e
gênero nos espaços público e privado realizada pela fundação Perseu Abramo em
2010. De acordo com o documento, 68% das entrevistadas tiveram seus partos na
rede pública e cerca de 25% já foram vítimas de violência exercidas pelos
profissionais de saúde.
Dentro do conjunto de práticas
violentas, foram encontradas as seguintes situações: exame de toque doloroso (10%),
negou ou não ofereceu algum paliativo para dor (10%), gritou com a mulher
durante o trabalho de parto (9%) e não atendeu a mulher (8%).
Também foram
relatadas expressões que algumas mulheres ouvem durante o parto: não chora não
que no ano que vem você está aqui de novo (15%), na hora de fazer não chorou/
não chamou a mamãe, por que está chorando agora? (14%), se gritar eu paro agora
o que estou fazendo, não vou atender (6%) e se ficar gritando vai fazer mal para
o seu neném, ele vai nascer surdo (5%).
Além destes maus-tratos durante o
parto, é percebido que as mulheres são as principais impactadas pela violência
institucional representada pela dificuldade no acesso, falta de profissionais
para atendimento, escassez de atendimentos e longo tempo de espera.
Cabe
assinalar que as mulheres são as mais impactadas por que há uma condição
imposta socialmente de que elas são responsáveis pelo bem-estar da família e assim,
elas procuram estes serviços para algum membro da família.
O que se percebe, diante da
violência institucional sofrida pelas mulheres em diferentes momentos da vida,
é que a desigualdade e a exclusão são aspectos que tangenciam inúmeros aspectos
da vida da mulher tanto nos espaços públicos como nos privados.
Isto se torna
emblemático pelo persistente conjunto de dificuldades que afetam o acesso da
mulher a um trabalho com igualdade, à uma saúde com qualidade e à uma vida sem
discriminação e violência.
Para frente a esta realidade nos
serviços de saúde, são necessárias políticas e medidas que afetem a lógica que
organiza a intervenção de profissionais e a dinâmica dos serviços de saúde bem
como a responsabilização legal por atendimentos abusivos que violam os direitos
e a autonomia das mulheres.
E quanto a lógica excludente e
discriminatória no espaço privado, acredito que um dos pilares para o combate
desta realidade é a educação voltada para a igualdade entre os gêneros. As
desigualdades são aprendidas, criadas e reforçadas desde a infância.
E você, caro (a) leitor (a)? O
que tem feito?
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